sábado, 22 de dezembro de 2012

Conto de Cama

Me chamou a atenção a quantidade de folhas bonitas que ela tinha. Eram tantas e tão bem desenhadas... Tinham formas tão bonitas que desejei poder conhecer a árvore que as hospedou um dia, pra viver em baixo dela e ver tuas folhas caírem uma a uma enquanto o tempo passa devagar. Então de costas com um sorriso e um olhar de canto disse com cara de ansiedade e totalmente decidida: "Com essas, vou lhe fazer uma mais bonita". Pra mim? Mais bonita? E assim ela começou a pisoteá-las, como fazem as belas jovens italianas que vemos pisoteando uvas em filmes, segurando seus longos vestidos e rindo e dançando. Ela só não cantava, ria. Não pude deixar de notar que no céu passavam bandos e bandos de papagaios enquanto as pessoas apontavam, completamente admiradas. Voltei pra moça, pra sua dança cheia de graça. De repente, suas folhas já não eram mais folhas. Pisoteadas, elas esfarelavam como pão, e o vento dava vida a barquinhos. A barquinhos de folha. E navegavam! E navegavam bonito! Navegavam no mar que se aconteceu em nossa volta. Eu, que pousava num lugar seco - talvez uma casa-barco - via-os vindo em minha direção. Tentei segurar um, ele afundou. Estiquei-me mais e num segundo o trouxe. Quando voltei a olhá-la, vi um sorriso de parar no tempo, mais intenso e mais leve que o vento. Sereno, longe, infinito. Daquele em que o corpo todo fica com vergonha de se mostrar tão de perto da boca. Era da cor da aurora, que só dura o "agora". Com toda graça do mundo ela então desceu de onde fabricava barquinhos de folha e mergulhou. E nadou. E nadou até minha casa-barco. Eu a vi, de cabelo molhado, de roupa molhada, de riso molhado, de alma entregue. Um beijo. Minha camisa puxada por ela. Eu na água de jeans e sorriso também. Nadamos pro nada, só pra caso de nosso tudo estar perdido nesses mares. Só pra caso os mares fossem nosso "tudo bem". Acordei.

sábado, 1 de dezembro de 2012

Tão Calma, Tão Ira

Como num deserto, onde o homem que já delira, tenta entender o que o vento assovia. E se esforça. E nele se guia. E sucumbia de ver que o assovio cochicharia, aquilo que ouvira. Delírios à parte, o teu oásis era bem verdadeiro, tanto que nem ele acreditou de primeiro, tanto que não. Até que assim, de tanto a areia seca matar tua sede em vão, entregou-se ao um certo fim. Então em um só momento, depois de tropeçar no vento, começou a viver o frenesi da sombra na qual caíra. Tão calma, tão ira. Tão louca essa calmaria que o atropelou, enroscou e enlouqueceu tão branco quanto o branco dos ombros, tão forte quanto o calor que fazia. E que agora o deixa de carinho nas mãos, depois de cada partida. E suas camisas, rasgadas e lisas, estavam mesmo é se despedindo do lado de fora. E ela enrolada, pro lado de dentro, ria. Num doce e solto tempo.